CHIKAOKA COMANDA UM PROJETO NO PARÁ
FOTO MARINA CAVALCANTE
Por Rafael Rodrigues
Fotografia para ver, mas também para pegar, para reconhecer-se, para entender mais sobre o mundo. Para além da superfície visível, a "escrita da luz" - como podemos traduzir o termo grego fotografia - é depositária de anseios, possibilidades e saberes. O paraense Miguel Chikaoka coloca em prática, em sua ONG Fotoativa, essa visão de fotografia transdisciplinar, potencialmente transformadora e despida de excessos.
Em sua participação no Seminário Arte, Invenção e Experiências Formativas, o fotógrafo, educador e ativista cultural lançou foco sobre o elemento básico da fotografia: a luz, entendida como potência capaz de interferir em nossas percepções cotidianas.
O interesse pelo essencial, no entanto, não leva Miguel Chikaoka pelo caminho fácil da demonização do que seria supérfluo - as tecnologias digitais que popularizaram a fotografia. Longe disso, ele considera tais dispositivos extensões do que já fazemos mentalmente ou do que já punhamos em prática na fotografia analógica.
Nos trechos a seguir, Chikaoka fala sobre educação e a própria experiência no exercício da mudança de olhares. Confira.
Pergunta - Você mostra interesse pela fotografia como uma série de processos, algo além do visível, do superficial. Como esse interesse foi se consolidando na sua trajetória?
Miguel Chikaoka - No início da minha carreira como fotógrafo, houve o deslocamento de uma profissão que apontava para uma afirmação na sociedade - ser engenheiro, formado pela Unicamp, te dá um suporte, digamos assim. Você fica "bem na foto". Mas havia dentro de mim essa inquietação: pra quem eu vou entrar nessa profissão? Para o benefício de quem? Isso é algo que antecede a minha formação. Minha formação religiosa já previa que você está aqui para fazer alguma coisa, que traga benefícios para todos. Então eu não vi muito, na função de engenheiro, no que eu poderia ser útil. Eu ia entrar numa máquina, ia criar coisas, mas nessa estrutura que até hoje persiste, que é essa desigualdade retroalimentada pelo nosso próprio sistema. Então surge na fotografia essa história de expressar essa angústia, esse ver crítico. A fotografia me leva a esse caminho de descobrir, pela própria necessidade de retroalimentar essa aprendizagem, conhecimento técnico, científico, histórico, social... você vai encontrando um aprendizado também pelo viés do outro olhar, de quem está na sua frente. Vou encontrar um campo vastíssimo que nos leva a encontrar a luz, algo universal, essencial, vital, que é cara a todos nós, e para a qual não damos um olhar que mostre as possibilidades que ela oferece.
Pergunta - Quando você fala sobre a ideia de luz como algo essencial, isso parece nos convidar a voltar para os elementos essenciais da fotografia, a luz e a sombra. Num contexto em que se tem muita manipulação de imagens, ao bel prazer das pessoas, falta essa compreensão mais básica do que luz e sombra podem fazer?
Miguel - Esse campo da finalização do processo, da captura da imagem, é uma pequena parte daquilo que está posto no percurso. O que se faz hoje, é claro, é resultado de um avanço tecnológico, do conhecimento humano. Mas você sabe que a manipulação que é feita hoje, se faz na mente. A possibilidade que temos hoje de gravar, mostrar num monitor, está no mesmo modo, semelhante ao que nós temos no cérebro. É um universo paralelo à manipulação que também fazemos na mente. Não estou aqui condenando as pessoas que mergulham e ficam horas lá manipulando imagens. São coisas... Eu poderia estar mergulhado num laboratório fotográfico. O que interessa é no que isso resulta em termos de crescimento do indivíduo, com uma consciência planetária. Eu sempre me pergunto: por que isso acontece? Para quê? Não olhar apenas para o passado, mas também para frente.
Pergunta - Como na prática os educadores inseridos no sistema de ensino formal podem se aproveitar de ideias e práticas da fotografia para levarem isso até a sala de aula?
Miguel - Acho que ter uma experiência mínima, para vivenciar um processo básico em algumas atividades. Ter um olhar crítico e visualizar algo que ele considere passível de ser introduzida na prática. Saber que, por exemplo, um professor de matemática, ele pode enxergar, em algum momento do processo, algo que potencializa a discussão sobre a questão das formas geométricas ou do sistema métrico. Ele pode construir uma câmera, que é um objeto tridimensional, que é uma forma geométrica, que tem uma medida, e que no final vai nos permitir ver uma imagem. Claro que isso é do prazer, e da curiosidade que ele desperta (com a atividade), o interesse de gostar de falar sobre esse assunto. O grande problema dos traumas que nós carregamos, de não gostar disso ou daquilo, pode estar num erro durante o processo. "Destesto ciências exatas", "não gosto de biologia". Isso pode vir de uma experiência não agradável, prazerosa, instigante. O educador não pode enxergar isso como ensino de fotografia nunca. Ele tem que enxergar o percurso interessante para a obtenção de uma imagem.
Fotografia para ver, mas também para pegar, para reconhecer-se, para entender mais sobre o mundo. Para além da superfície visível, a "escrita da luz" - como podemos traduzir o termo grego fotografia - é depositária de anseios, possibilidades e saberes. O paraense Miguel Chikaoka coloca em prática, em sua ONG Fotoativa, essa visão de fotografia transdisciplinar, potencialmente transformadora e despida de excessos.
Em sua participação no Seminário Arte, Invenção e Experiências Formativas, o fotógrafo, educador e ativista cultural lançou foco sobre o elemento básico da fotografia: a luz, entendida como potência capaz de interferir em nossas percepções cotidianas.
O interesse pelo essencial, no entanto, não leva Miguel Chikaoka pelo caminho fácil da demonização do que seria supérfluo - as tecnologias digitais que popularizaram a fotografia. Longe disso, ele considera tais dispositivos extensões do que já fazemos mentalmente ou do que já punhamos em prática na fotografia analógica.
Nos trechos a seguir, Chikaoka fala sobre educação e a própria experiência no exercício da mudança de olhares. Confira.
Pergunta - Você mostra interesse pela fotografia como uma série de processos, algo além do visível, do superficial. Como esse interesse foi se consolidando na sua trajetória?
Miguel Chikaoka - No início da minha carreira como fotógrafo, houve o deslocamento de uma profissão que apontava para uma afirmação na sociedade - ser engenheiro, formado pela Unicamp, te dá um suporte, digamos assim. Você fica "bem na foto". Mas havia dentro de mim essa inquietação: pra quem eu vou entrar nessa profissão? Para o benefício de quem? Isso é algo que antecede a minha formação. Minha formação religiosa já previa que você está aqui para fazer alguma coisa, que traga benefícios para todos. Então eu não vi muito, na função de engenheiro, no que eu poderia ser útil. Eu ia entrar numa máquina, ia criar coisas, mas nessa estrutura que até hoje persiste, que é essa desigualdade retroalimentada pelo nosso próprio sistema. Então surge na fotografia essa história de expressar essa angústia, esse ver crítico. A fotografia me leva a esse caminho de descobrir, pela própria necessidade de retroalimentar essa aprendizagem, conhecimento técnico, científico, histórico, social... você vai encontrando um aprendizado também pelo viés do outro olhar, de quem está na sua frente. Vou encontrar um campo vastíssimo que nos leva a encontrar a luz, algo universal, essencial, vital, que é cara a todos nós, e para a qual não damos um olhar que mostre as possibilidades que ela oferece.
Pergunta - Quando você fala sobre a ideia de luz como algo essencial, isso parece nos convidar a voltar para os elementos essenciais da fotografia, a luz e a sombra. Num contexto em que se tem muita manipulação de imagens, ao bel prazer das pessoas, falta essa compreensão mais básica do que luz e sombra podem fazer?
Miguel - Esse campo da finalização do processo, da captura da imagem, é uma pequena parte daquilo que está posto no percurso. O que se faz hoje, é claro, é resultado de um avanço tecnológico, do conhecimento humano. Mas você sabe que a manipulação que é feita hoje, se faz na mente. A possibilidade que temos hoje de gravar, mostrar num monitor, está no mesmo modo, semelhante ao que nós temos no cérebro. É um universo paralelo à manipulação que também fazemos na mente. Não estou aqui condenando as pessoas que mergulham e ficam horas lá manipulando imagens. São coisas... Eu poderia estar mergulhado num laboratório fotográfico. O que interessa é no que isso resulta em termos de crescimento do indivíduo, com uma consciência planetária. Eu sempre me pergunto: por que isso acontece? Para quê? Não olhar apenas para o passado, mas também para frente.
Pergunta - Como na prática os educadores inseridos no sistema de ensino formal podem se aproveitar de ideias e práticas da fotografia para levarem isso até a sala de aula?
Miguel - Acho que ter uma experiência mínima, para vivenciar um processo básico em algumas atividades. Ter um olhar crítico e visualizar algo que ele considere passível de ser introduzida na prática. Saber que, por exemplo, um professor de matemática, ele pode enxergar, em algum momento do processo, algo que potencializa a discussão sobre a questão das formas geométricas ou do sistema métrico. Ele pode construir uma câmera, que é um objeto tridimensional, que é uma forma geométrica, que tem uma medida, e que no final vai nos permitir ver uma imagem. Claro que isso é do prazer, e da curiosidade que ele desperta (com a atividade), o interesse de gostar de falar sobre esse assunto. O grande problema dos traumas que nós carregamos, de não gostar disso ou daquilo, pode estar num erro durante o processo. "Destesto ciências exatas", "não gosto de biologia". Isso pode vir de uma experiência não agradável, prazerosa, instigante. O educador não pode enxergar isso como ensino de fotografia nunca. Ele tem que enxergar o percurso interessante para a obtenção de uma imagem.
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